quarta-feira, 19 de maio de 2010

Escravos da superstição

A quantidade de disparates que a gente acompanha na mídia em Moçambique é absurdamente alta. Para mim a pérola no ano de 2009 foi: “ Membro do governo distrital na Zambézia morto acusado de reter chuva no céu”.

Histórias como estas repetem-se em várias partes deste vasto país. O povo aqui é muito supersticioso e por isso a quantidade de coisas estúpidas que a gente vê é enorme. A alguns dias atrás via o noticiário na TV e fiquei boquiaberto: numa escola secundária nos arredores de Maputo foi reportado desmaios em massa, para ser mais preciso: 20 raparigas no total desmaiaram em plena escola e acabaram no hospital.

Outro facto: a escola foi construída sobre um antigo cemitério.

O que diz a população local: os mortos estão zangados e estão a fazer vingança. Muitos pais e encarregados de educação ponderam retirar os filhos da escola. Alguns curandeiros já propuseram fazer-se uma cerimónia tradicional na referida escola para “acalmar” os espíritos.

A mim o “povo” já não me surpreende. Mas a imprensa e as autoridades da Saúde deste país não ajudam em nada. Os canais televisivos simplesmente alimentam a especulação por não procurarem ouvir o diagnóstico médico e satisfazerem-se com a palavra do “povo”. A enfermeira entrevistada também não fez mais do que pôr lenha na fogueira! Parecia mais assustada que os encarregados de educação e nem uma palavra sobre o diagnóstico e exames clínicos.

Até agora não vi um único médico ou autoridade sénior da saúde se pronunciar oficialmente sobre o assunto e o pânico vai tomando conta dos alunos e seus encarregados de educação. Obviamente que isto não tem nada a ver com espíritos mas sim algum tipo de problema de saúde pública. O “povo” não entende isso, e tende muitas vezes a distorcer os factos. Eu não ficaria surpreendido se a direcção da escola fosse obrigada a organizar a tal cerimónia para “acalmar” os espíritos! Seria o cúmulo.

Este tipo de fenómeno não é novo, apesar de raro. No México, em novembro de 2007, 600 raparigas de 12 a 17 anos, apresentaram sintomas estranhos sem razão aparente: dificuldade para andar, febre e náuseas. As autoridades de saúde não conseguiam dar nenhuma explicação lógica, mas após vários exames, inspeções nas instalações da escola e entrevistas com algumas meninas afetadas, os médicos concluíram que o responsável era um distúrbio psicológico. Esse fenômeno é conhecido como distúrbio psicogênico em massa, também chamado de histeria coletiva, reação psicossomática ou histeria em massa, e já foram descritos mais de 80 casos em todo o mundo e ocorre com freqüência em comunidades isoladas. A histeria coletiva pode se espalhar quando existe um medo de exposição a uma doença, associado a um ambiente estressante e fechado.

Enfim, aguardemos alguns dias e teremos novos desenvolvimentos! Mas parece-me que os serviços de saúde têm a grande responsabilidade de desmistificar esses acontecimentos.

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